Como tecidos e órgãos são formados durante a embriogênese?
Você já se perguntou como
grupos de células se estruturam para formar tecidos e órgãos enquanto ainda em
estado embrionário?
Através de tecnologias de
ponta recentes, pesquisadores da Universidade da Califórnia – Santa Bárbara,
liderados por Otger Campàs, abordaram este mistério, revelando os
surpreendentes trabalhos internos da maquinaria biológica na formação de
embriões. Além de ajudar a entender o processo de formação embrionária humana,
as técnicas utilizadas possibilitam o estudo de outros pontos importantes para
a saúde humana, como o surgimento e proliferação de tumores, ou ainda como
projetar órgãos sintéticos.
“Resumidamente, descobrimos
um mecanismo físico fundamental que as células usam para moldar os tecidos
embrionários em seu formato funcional tridimensional”, diz Campàs. Seu grupo
investiga como sistemas vivos organizam a si mesmos para construir as
estruturas e formas singulares encontradas na natureza
Células se coordenam através
de sinalização química, mas também se prendem e “empurram” umas às outras para
contruir as estruturas fundamentais que precisamos para viver, como olhos,
coração e pulmões. O que foi descoberto é que este processo não se distancia da
ideia de moldar vidro ou impressão 3D. No trabalho “A fluid-to-solid jamming
transition underlies vertebrate body axis elongation”, publicado na Nature,
Campàs e colegas mostram que grupos celulares mudam de estado fluido para
sólido de maneira controlada para construir o embrião vertebrado, de forma semelhante
à moldagem do vidro enquanto ainda está quente – como fluido – e ao ser
resfriado – em que admite características de sólido. Ou ainda na analogia da
impressão 3D, é como se nos imprimíssemos em 3D, por dentro.
A maior parte dos objetos
surge como fluidos. De ligas metálicas à sobremesas gelatinosas, o formato é
obtido a partir do conjunto dos materiais componentes derretidos colocados em
um molde, e depois de resfriado o conjunto, tem-se o objeto sólido. Do mesmo
modo, células em algumas regiões do embrião são mais ativas e “derretem” o
tecido em um estado fluido, para que possa ser reestruturado. Uma vez
determinado o formato, elas “resfriam” para manter a forma do tecido, explica
Campàs.
A descoberta só foi possível
graças ao uso de técnicas, previamente desenvolvidas pelo grupo, para medir as
forças entre células de embriões, e também exercer forças minúsculas nessas
células conforme elas constroem os tecidos e órgãos.
Foram utilizados embriões de
peixe-zebra, favorecidos pela transparência óptica porém desenvolvimento
embrionário muito semelhante ao humano. Os pesquisadores colocaram pequenas
partículas de um fluido ferromagnético entre as células do tecido em
crescimento. Essas partículas esféricas se deformam de acordo com a
movimentação e força exercida pelas células no seu entorno, possibilitando uma
resposta visual de como essas forças intercelulares são aplicadas. Além disso,
visto que as partículas são magnéticas, também é possível exercer força
contrária às células do entorno para observar a resposta dos tecidos.
O artigo publicado na Nature
também é ponto de partida para que o grupo de Campàs possa estudar outros
processos do desenvolvimento embrionário e outros assuntos relacionados, como a
forma que tumores fisicamente “invadem” tecidos adjacentes ou ainda como projetar
órgãos com formatos tridimensionais específicos.
“Uma das características
marcantes do câncer é a transição entre diferentes tipos de tecidos. Essa
transição pode, a princípio, ser explicada como uma mudança anômala de um
estado sólido para um estado fluido do tecido em questão.” Explica Alessandro
Mongera, autor principal do artigo. “O estudo pode ajudar a elucidar os
mecanismos fundamentais dessa conversão e destacar possíveis alvos do processo
para impedir o avanço do tumor.”
Falaí
Biotec
Referências:
Alessandro Mongera, Payam Rowghanian, Hannah J.
Gustafson, Elijah Shelton, David A. Kealhofer, Emmet K. Carn, Friedhelm
Serwane, Adam A. Lucio, James Giammona, Otger Campàs. A fluid-to-solid
jamming transition underlies vertebrate body axis elongation. Nature,
2018; DOI: 10.1038/s41586-018-0479-2
Acesso em: 09/09/2018
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